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RELAT?RIO DE DIREITOS HUMANOS E DOS

DEFENSORES DOS DIREITOS HUMANOS REFERENTE AO PRIMEIRO SEMESTRE DE 2020

EM MO?AMBIQUE

Celebrando o Dia Internacional da Democracia

Maputo, 15 de Setembro de 2020

RELAT?RIO DE DIREITOS HUMANOS E DOS DEFENSORES DE DIREITOS HUMANOS REFERENTE AO PRIMEIRO SEMESTRE DE 2020 EM MO?AMBIQUE

I. CONTEXTUALIZA??O

Mo?ambique ? um Estado de Direito Democr?tico, bem como de justi?a social, baseado no respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais dos cidad?os, conforme plasmado na Constitui??o da Rep?blica, no qual a Administra??o P?blica tem como obriga??o legal prosseguir o interesse p?blico, a defesa e a promo??o dos direitos humanos. Neste contexto, o Estado mo?ambicano assinou v?rios compromissos internacionais que o vinculam a respeitar, promover, proteger e realizar os direitos humanos.

No entanto, s?o not?rias v?rias pr?ticas contr?rias aos direitos humanos, ao princ?pio da igualdade perante a lei e aos mais essenciais princ?pios democr?ticos e de boa governa??o relevantes para a salvaguarda dos direitos humanos.

N?o menos importante s?o os chamados direitos humanos difusos e colectivos, como ? o caso do direito ao ambiente e direitos dos consumidores, atendendo que os cidad?os t?m sido v?timas de um servi?o p?blico prec?rio, sobretudo no que diz respeito ao acesso a transporte p?blico, ? ?gua e ? energia el?ctrica.

O grupo dos direitos humanos retro mencionados deve tamb?m ser analisado no contexto da declara??o do Estado de Emerg?ncia para a preven??o da pandemia da COVID-19, bem como no contexto dos ataques terroristas na Prov?ncia de Cabo Delgado e dos ataques armados em Manica e Sofala. Trata-se de factores que t?m evidenciado a problem?tica da protec??o dos direitos humanos e acesso ? justi?a em Mo?ambique como prioridade na agenda p?blica de governa??o.

O primeiro semestre do ano de 2020 n?o constituiu excep??o em rela??o ?s pr?ticas violadoras dos direitos humanos de v?ria ordem, como ? o caso, por um lado, dos cl?ssicos direitos civis e pol?ticos, com destaque para a actua??o repressiva da Pol?cia da Rep?blica de Mo?ambique (PRM), a quest?o do direito ? seguran?a p?blica e as barreiras ao exerc?cio do direito ? informa??o, liberdade de express?o e de manifesta??o.

Por outro lado, o caso dos direitos econ?micos, sociais e culturais, com destaque para as actividades do Governo do dia relativamente ? gest?o do bem p?blico para equilibrar as desigualdades sociais e oferecer melhores oportunidades aos cidad?os para a realiza??o do direito ao desenvolvimento e justi?a social a partir do f?cil acesso aos servi?os de sa?de, educa??o, habita??o condigna, emprego, ?gua e seguran?a alimentar.

O Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD) preconiza, desde a sua constitui??o, a promo??o e defesa dos direitos humanos numa perspectiva de advocacia em torno do desenvolvimento e da aplica??o dos princ?pios democr?ticos em Mo?ambique. Por isso, a elabora??o do relat?rio semestral de direitos humanos como ensaio pr?tico para a elabora??o do relat?rio anual mais robusto e detalhado referente ao ano de 2020 ? fundamental para avaliar e dar a conhecer ao p?blico em geral, quer o conjunto das actividades levadas a cabo em prol dos direitos humanos, quer o n?vel da sua promo??o e protec??o em Mo?ambique.

Neste relat?rio foram tamb?m consideradas as ac??es e reac??es do poder p?blico e as suas rela??es com as empresas cujas actividades impactam sobremaneira nos direitos humanos das comunidades locais afectadas pelos projectos da ind?stria extractiva, principalmente no

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que diz respeito aos direitos sobre a terra e benef?cios directos dos grandes investimentos na explora??o dos recursos naturais.

Desta forma, a elabora??o do Relat?rio de Direitos Humanos e dos Defensores de Direitos Humanos Referente ao Primeiro Semestre de 2020 visa analisar o panorama pol?tico, legal e institucional que facilita e/ou dificulta a promo-

??o, respeito e protec??o dos direitos humanos em Mo?ambique, tendo por base a l?gica da classifica??o e contextualiza??o dos direitos humanos tem?ticos supra indicados.

Para cada parte, a abordagem visa identificar os direitos humanos actualmente problem?ticos, bem como as ac??es e os mecanismos existentes para a sua promo??o e protec??o.

II. METODOLOGIA

A principal metodologia para a materializa??o dos objectivos do relat?rio teve por base a pesquisa, a busca de informa??o, a identifica??o e documenta??o das viola??es, a an?lise e interpreta??o das leis e normas relevantes sobre as

dimens?es do respeito, promo??o, protec??o e realiza??o dos direitos humanos, com particular enfoque sobre as pr?ticas e/ou comportamentos institucionais relativamente ? quest?o dos direitos humanos.

III. ESTRUTURA DO RELAT?RIO

Da aplica??o da metodologia escolhida, o relat?rio tem, al?m das notas introdut?rias gerais e do sum?rio executivo, a seguinte estrutura: uma parte relativa ? avalia??o do quadro legal e de pol?ticas p?blicas dos direitos humanos em Mo?ambique; seguidamente, a avalia??o

do quadro institucional sobre os direitos humanos, bem como uma parte relativa ? descri??o anal?tica dos casos de viola??o ocorridos no primeiro semestre de 2020 e respectivas responsabilidades; e, por fim, a apresenta??o das conclus?es, principais desafios e recomenda??es.

IV. OBJECTIVOS

Reflectir sobre a actua??o das institui??es da Justi?a no que tange ? salvaguarda dos direitos humanos em Mo?ambique e chamar a aten??o para a institucionaliza??o de um Estado de direitos humanos no Pa?s.

Denunciar as viola??es dos direitos humanos e exigir responsabilidades por via da aplica??o correcta da lei em respeito ?s regras do Estado de Direito Democr?tico.

Reflectir sobre as reformas espec?ficas da legisla??o, pol?ticas p?blicas e comportamento institucional no que diz respeito aos direitos humanos, sobretudo na quest?o das solu??es existentes e efectivos para a repara??o dos danos.

Discutir formas eficazes de promo??o da credibiliza??o do sistema da Justi?a, sobretudo no que diz respeito ? prontid?o das institui??es da Justi?a para a protec??o e promo??o dos direitos humanos.

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QUADRO LEGAL E INSTITUCIONAL

As quest?es de direitos humanos que este relat?rio apresenta t?m por base a Constitui??o da Rep?blica, a legisla??o infraconstitucional relevante sobre os direitos humanos, bem como as pol?ticas p?blicas que promovem o seu respeito. Os instrumentos internacionais de protec??o dos direitos humanos de que Mo?ambique ? parte tamb?m s?o analisados neste relat?rio.

Relativamente ao quadro institucional, importa dizer que em Mo?ambique as principais institui??es em mat?ria de promo??o e protec-

??o dos direitos humanos integram os Poderes Executivo, Legislativo e Judicial. O quadro institucional inclui ainda outras institui??es p?blicas relevantes, como s?o os casos do Minist?rio P?blico/Procuradoria-Geral da Rep?blica (PGR), Comiss?o Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), Provedor de Justi?a, Ordem dos Advogados de Mo?ambique (OAM) e a PRM. A actua??o e interven??o de cada institui??o na promo??o, respeito, protec??o e realiza??o dos direitos humanos durante o primeiro semestre ser? analisada neste relat?rio.

EXERC?CIO DO DIREITO ? INFORMA??O

O direito fundamental ? informa??o est? consagrado no artigo 48 da Constitui??o da Rep?blica e ? essencialmente regulado na Lei 34/2014, de 31 de Dezembro ? Lei do Direito ? Informa??o, e no respectivo Regulamento ? Decreto n? 35/2015, de 31 de Dezembro. Igualmente, o direito ? informa??o ? regulado em diversa legisla??o relevante sobre o funcionamento da Administra??o P?blica e em diferentes instrumentos de protec??o dos direitos humanos, como ? o caso da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Pol?ticos.

No entanto, a imprensa nacional e a sociedade civil t?m demonstrado que Mo?ambique ? caracterizado profundamente por obst?culos s?rios ao exerc?cio do direito ? informa??o, como ? o caso da falta de abertura das autoridades para discutir o exerc?cio da democracia e o acesso ? informa??o de forma isenta. As autoridades p?blicas t?m tend?ncia de perpetuar a cultura do secretismo e de denega??o infundada de informa??o de interesse p?blico.

Um dos objectivos fundamentais do Estado, conforme resulta da al?nea f) do artigo 11 da Constitui??o da Rep?blica, ? "o fortalecimento da democracia, da liberdade, da estabilidade social e da harmonia social e individual." A materializa??o deste objectivo depende da remo??o dos obst?culos ao correcto exerc?cio do

direito ? informa??o, de acordo com as normas e princ?pios que o regulam, sejam de natureza interna ou internacional. A informa??o ? poder para quem a det?m e ? elemento fundamental para a democratiza??o do Estado, na medida em que permite a participa??o p?blica consciente e informada sobre o processo de tomada de decis?o em mat?ria de interesse p?blico.

? nestes termos que os cidad?os devem ser integralmente informados sobre os processos de investimentos e de desenvolvimento em curso no Pa?s, sobre as grandes reformas legais e de pol?ticas p?blicas, sobre a estrutura e o funcionamento das institui??es p?blicas e privadas que realizam actividades de interesse p?blico, sobre os processos eleitorais, sobre a utiliza??o dos bens e servi?os p?blicos e sobre os mecanismos postos em pr?tica para efectivar a democracia e realizar os direitos humanos.

Na sua ess?ncia, a democracia n?o pode funcionar sem assegurar o pleno respeito pelos direitos e liberdades fundamentais, os quais integram o direito ? informa??o, que, por sua vez, est? no cerne da governa??o democr?tica e permite a realiza??o de outros direitos humanos conexos, como ? o caso da liberdade de express?o.

Em Mo?ambique, a cultura do secretismo e da denega??o de informa??o de interesse p?blico, sobretudo de mat?rias sens?veis ou dos "chamados

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casos quentes", est? institucionalmente enraizada e at? parece ser uma pr?tica reiterada com convic??o de obrigatoriedade, sen?o vejamos:

? Conselho Constitucional e a protec??o do direito ? informa??o

O Provedor de Justi?a aceitou o pedido, submeteu o caso ? aprecia??o do Conselho Constitucional e, atrav?s do Ac?rd?o n.? 5/CC/2020, de 30 de Mar?o, referente ao Processo n.? 08/ CC/2018, deliberou pela n?o declara??o da inconstitucionalidade da norma contida no n.? 1 do artigo 4 da Lei n.? 12/79, de 12 de Dezembro (Lei sobre o Segredo Estatal), alegadamente porque n?o viola o disposto nos n.?s 1 e 6 do artigo 48 e n.? 3 do artigo 56, ambos da Constitui??o da Rep?blica.

Esse Ac?rd?o n.? 5/CC/2020, de 30 de Mar?o, resultou de uma ac??o para a aprecia??o da inconstitucionalidade interposta pelo Provedor de Justi?a contra a norma contida no n.? 1 do artigo 4 da Lei sobre o Segredo Estatal que estabelece o seguinte:

Art. 4- Os documentos dividem-se em dois grupos:

1) Documentos classificados:

"S?o aqueles que cont?m dados e informa??es de natureza militar, pol?tica, econ?mica comercial, cient?fica, t?cnica ou qualquer outra cuja divulga??o prejudique a seguran?a do Estado e do povo e a economia nacional."

O regime jur?dico sobre o segredo do Estado consagrado na Lei sobre o Segredo Estatal constitui exemplo paradigm?tico de leis ou normas que contrariam o direito ? informa??o, na medida em que apresenta conceitos indeterminados, insuficientes e inintelig?veis, quando refere que o regime jur?dico do segredo estatal inclui documentos contendo dados e informa??es de natureza militar, pol?tica, econ?mica comercial, cient?fica, t?cnica ou qualquer outra cuja divulga??o prejudique a seguran?a do Estado e do povo e a economia nacional.

Nos termos em que a disposi??o legal sobre o

segredo do Estado est? formulada faz com que o exerc?cio do direito ? informa??o esteja dependente da vontade e iniciativa de quem det?m informa??o de interesse p?blico. Ou seja, nos termos da Lei sobre o Segredo Estatal toda informa??o ? pass?vel de ser considerada secreta, o que est? em contradi??o com a Constitui??o da Rep?blica.

Nos termos do n.? 3 do artigo 56 da Constitui??o da Rep?blica, "a lei s? pode limitar os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constitui??o." Por sua vez, a Lei n.? 34/2014, de 31 de Dezembro (Lei do Direito ? Informa??o) estabelece o princ?pio da proibi??o de excep??es ilimitadas - al?nea g), do n.? 2 do artigo 4. Igualmente, o artigo 11 da Lei do Direito ? Informa??o determina: "a n?o divulga??o ou recusa de disponibiliza??o da informa??o deve ser sempre fundamentada com base no regime das excep??es e restri??es legais".

A Lei sobre o Segredo Estatal n?o define de forma clara e inequ?voca o segredo do Estado, nem por outra forma se refere expressamente sobre o significado do mesmo, tampouco determina, inequivocamente, em que circunst?ncias aquelas informa??es devem ser entendidas como classificadas.

As restri??es legais aos direitos e liberdades fundamentais s? s?o admiss?veis nos casos expressamente previstos na Constitui??o, termos em que qualquer norma ou lei infraconstitucional deve consagrar restri??es de forma expressa e clara. Isto significa que a formula??o de limita??es ao direito fundamental ? informa??o atrav?s de conceitos indeterminados, como acontece na Lei sobre o Segredo Estatal, deve ser declarada inconstitucional.

O Conselho Constitucional sustenta a sua decis?o proferida no Ac?rd?o n.? 5/CC/2020, de 30 de Mar?o, dizendo: "Na ordem jur?dica mo?ambicana, o segredo do Estado constitui uma autoriza??o de restri??o legal ao direito ? informa??o e ? um dos meios de garantir a conten??o de acesso ou divulga??o de mat?rias que n?o devem ser de dom?nio p?blico." E acrescenta: "A exist?ncia de um regime jur?dico sobre

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